Escrito por: IG Economia

Crise projeta o Brasil entre os protagonistas do mundo

No aniversário de dois anos da maior turbulência dos últimos 80 anos, Brasil comemora altas(...)

No aniversário de dois anos da maior turbulência dos últimos 80 anos, Brasil comemora altas taxas de crescimento econômico

 

Não foi a “marolinha” que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esperava, mas a crise do subprime ajudou o mundo a voltar os olhos para o Brasil. Dois anos após o estopim da maior turbulência econômica dos últimos 80 anos – completados nesta quarta-feira, aniversário da quebra do banco de investimento Lehman Brothers, em 15 de setembro de 2008 -, a economia brasileira ganhou holofotes pela rápida recuperação, após a primeira queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 17 anos, ao contrário do que acontecia em crises anteriores das décadas de 1980 e 1990. Agora, no pós-crise, o País sustenta uma das maiores taxas de crescimento do mundo.

 

Enquanto na Europa e nos Estados Unidos ainda existem temores com relação a uma nova depreciação da economia, puxada, principalmente, pelos altos índices de desemprego, no Brasil, a discussão é outra: poderá a economia seguir crescendo em um ritmo tão acelerado? Para este ano, espera-se que o PIB cresça acima dos 7%, o que será a maior expansão dos últimos 24 anos. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, diz que, até 2014, o Brasil deve crescer, em média, 5,5% ao ano

 

O Brasil e o mundo

 

O desempenho da economia brasileira surpreendeu o mundo. Desde o estouro da crise, o Fundo Monetário Internacional (FMI) errou todas as projeções que fez sobre o Brasil. Já com relação à Europa, o Fundo se mostrou benevolente e acabou surpreendido por resultados ruins das principais economias da região. Mas o Brasil não passou ileso pela crise. Em 2009, o PIB teve queda de 0,2%, o primeiro recuo desde 1992. No entanto, a baixa foi bem menor que a observada em outros países: nos Estados Unidos, a queda foi de 2,4%, a maior desde 1946, e a União Europeia teve baixa de 4,1%.

 

Em 2010, o Brasil também está à frente dos chamados países desenvolvidos: com crescimento de 9% no primeiro trimestre e 8,8% no segundo, o País só é superado pela China em termos de expansão entre as principais economias do mundo.

 

"A recessão por aqui durou apenas dois trimestres, o último de 2008 e o primeiro de 2009, segundo o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (CODACE), da FGV", diz Octávio de Barros, economista-chefe do banco Bradesco. "Cabe destacar que a média histórica de recessão no país é de 5 trimestres. Desde então, foram 5 trimestres consecutivos de expansão forte, cuja média foi de 2,0% ao trimestre."

 

Desempenho impressionante

 

“O desempenho do Brasil tem sido extremamente impressionante”, diz Jim O’Neill, economista-chefe do Goldman Sachs e criador do termo Brics (grupo de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Para ele, o Brasil deve crescer de 5% a 6% na década e, nos próximos 20 anos, deve responder por 5% de toda economia mundial.

 

O otimismo de O’Neill, no entanto, não deve ser atribuído somente ao desempenho do Brasil no pós-crise. Segundo especialistas brasileiros, a resposta do País está associada a fatores anteriores ao 15 de setembro de 2008. “A crise foi a oportunidade de consolidar a visão de que somos um país estável, previsível e com baixa vulnerabilidade a choques externos”, diz o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, sócio da consultoria Tendências.

 

É praticamente consenso entre os especialistas que o tripé da política econômica – câmbio flutuante, metas de inflação e responsabilidade fiscal –, o fortalecimento do mercado interno e a consolidação do sistema financeiro sustentaram o Brasil, enquanto o mundo sofria com o congelamento do financiamento Internacional, o baque no comércio mundial e a quebra de instituições.

 

“A crise chegou aqui não pelas causas, mas pelas conseqüências”, diz Rubens Ricupero, embaixador e ex-ministro da Fazenda. “Nos afetou pelo efeito da diminuição do comércio mundial e um pouco pela redução da oferta de financiamento global, enquanto em países europeus e nos Estados Unidos, as causas foram bolha imobiliária, sistema bancário fraco e problemas nas hipotecas.”

 

Ricupero destaca que a crise ajudou o Brasil a ganhar voz no cenário internacional, a partir do momento em que o G20 ganhou força como grande fórum da discussão mundial. No estouro da crise, a presidência rotativa do grupo das 20 maiores economias do mundo era ocupada pelo Brasil.

 

Desde então, praticamente todos os indicadores brasileiros já responderam ao pior da crise. As reservas internacionais – importante “colchão de proteção” contra a variação da moeda – estão em alta há 16 meses, ultrapassando a casa dos US$ 250 bilhões (no estouro da crise, estavam em US$ 207,4 bilhões). A geração de empregos com carteira assinada está em alta em todos os meses de 2010, enquanto a utilização da capacidade instalada da indústria e a produção industrial se aproximam dos patamares pré-crise.

 

Do ponto de vista do consumo (importante motor para a economia), o rendimento médio real habitual dos trabalhadores está no maior nível desde o estouro da crise. Pela primeira vez na história, mais da metade da população passou a compor a classe média. Cerca de 3,1 milhões de pessoas das classes D e E migraram para o segmento C entre 2008 e 2009.

 

Segundo Daniela Prates, professora de economia da Universidade de Campinas (Unicamp), a crise reforçou a condição do Brasil de “menina dos olhos” da economia mundial. Mas, a situação das contas externas pode fazer com que o cenário fique menos favorável ao País no longo prazo. “Estamos reduzindo nossa capacidade de gerar divisas via exportações e isso gera um déficit alto em transações correntes, aumentando o passivo externo. Sabemos que isso tem um limite”, afirma. Por outro lado, ela acredita que, no curto prazo, a situação será contornada pelo fluxo de capitais e pelas reservas internacionais.

 

Mailson da Nóbrega, da Tendências, não vê motivos para muito otimismo. “O Brasil dificilmente será uma grande potencia nos próximos anos. Eu diria que, se o País fizer tudo certo, daqui a uma geração teremos uma renda per capita parecida com a da Espanha de hoje.”

 

“O nosso bom desempenho é muito recente e durou muito pouco. O resultado só é convincente quando dura duas décadas, como no caso dos asiáticos”, completa Rubens Ricupero.