Escrito por: Conticom

1º Encontro Nacional da Mulher Trabalhadora nas Indústrias da Construção e do Mobiliário é realizado em Recife

Dezenas de lideranças femininas de todo o país para debater conjuntura e pautas da mulher trabalhadora

Nos últimos dias 24 e 25 foi realizado em Recife/PE o 1º Encontro Nacional da Mulher Trabalhadora nas Indústrias da Construção e do Mobiliário, que reuniu dezenas de lideranças femininas de todo o país para debater conjuntura e pautas da mulher trabalhadora. Estiveram presentes representantes dos estados de Pernambuco, Paraíba, São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul, Ceará e Bahia. O evento teve início com uma apresentação de frevo e capoeira, realizada por artistas locais.

Na mesa de abertura Dulcilene Moraes, Secretária de Mulheres da Conticom, Membro do Conselho Mundial da ICM e presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção de Recife (Marreta), destacou que neste momento de crise econômica e política, o setor mais penalizado da sociedade são as mulheres. “A gente vê que o primeiro ato pós impeachment foi acabar com a Secretaria Nacional da Mulher, e todo esse planejamento político visa paralisara classe operária. Estamos pagando a conta na reforma da previdência, na reforma tributária, nos cortes da saúde e educação. Nós mulheres já tínhamos pouca representação no Congresso e com essa crise ela foi reduzida. Já no mercado de trabalho, além de ter um salário 30% menor para a realização da mesma atividade, as mulheres são as primeiras a serem demitidas”, afirmou.

Além de Dulcilene compuseram a mesa, Edna Santos, representando a Conticom, Marina Gurgel, representando a Internacional da Construção e da Madeira (ICM), Mario Cesar,representando o Ministério do Trabalho Emprego/PE, Liana Araujo, da CUT/PE, Maria Neuma Lira, Secretaria da Mulher CUT/PE e Edvan, representante da Federação da Construção Norte Nordeste, que fizeram um breve saudação aos participantes e saudaram os 30 anos da organização de mulheres dentro da CUT.

No primeiro dia também houve uma apresentação de Marilaine Oliveira, pesquisadora da Unicamp, que falou sobre mulheres no trabalho e no sindicalismo. E destacou que “em uma sociedade marcada por múltiplas desigualdades, sejam elas regionais, de gênero, raça ou orientações sexual, em contexto de crise, como o que estamos vivendo, se exacerbam demais. Sejam os EUA e Europa com relação aos imigrantes, ou o Brasil na relação nordeste/sudeste, e também na desigualdade entre homens e mulheres. Estamos em um contexto de muito conservadorismo, onde a todo tempo está sendo questionada a legitimidade da ocupação de espaços públicos pelas mulheres”.

DUPLA JORNADA - Marilaine também destacou que o “perfil masculino da construção, e das indústrias numa forma geral não, tem nada de natural, são processos e construções sociais. São papeis determinados, em uma dimensão cultural que se reproduz de maneira convém para essa sociedade, de maneira em que as mulheres fiquem responsáveis pelo que chamamos de reprodução social, cuidando da família, idosos, filhos, casa, etc. De maneira que o estado não fique responsável, ou oferte muito pouco esses serviços públicos”.

APOSENTADORIA - Ela também destacou que “ao mesmo tempo pro capital é importante que as mulheres estejam no mercado de trabalho. Hoje 90% das mulheres que trabalham, são responsáveis por tarefas domésticas, e gastam em média 21 horas por semana, enquanto os homens gastam menos de 10 horas. Ou seja, não tem nenhum favor em as mulheres se aposentarem 5 anos antes que os homens, a mulher a vida toda tem jornada de trabalho mais extensa do que os homes. As taxas de desemprego sempre são o dobro para as mulheres. Trabalho domestico que havia caído nos últimos anos, voltou a crescer depois de 2015, porque o trabalho mais precário e imediato que aparece”.

ESCOLARIDADE MAIOR – Outro ponto importante é a qualificação, Marilaine destacou que “desde os aos 90 as mulheres tem escolaridade maior que os homens no Brasil. E isso não representa uma melhor inserção no mercado de trabalho. Não tem promoção para as mulheres, não tem investimento em qualificação, não tem salário igual para trabalho igual. Até no meio sindical, muitas vezes, quando é ocupado por homem o cargo parece ter outra conotação. As mulheres secretárias gerais fazem atas, mulheres tesoureiras são basicamente contadoras, enquanto homens nesses cargos tem espaço de poder e decisão, são cargos políticos”.

Após debate sobre o tema o primeiro dia foi encerrado por um tour por Recife, que contou a história da cidade.

Dia Internacional de Não Violência Contra a Mulher

O segundo dia de Encontro foi realizado no Dia Internacional de Não Violência Contra a Mulher, e foi iniciado com a palestra de Regina Célia, vice-presidente do Instituto Maria da Penha. Ela relatou a história de Maria da Penha e concluiu: “o Brasil é um país tolerante com a violência contra a mulher”. Regina fez um histórico da discussão sobre a violência contra a mulher no país e afirmou que o tema só foi discutido para além da saúde pública, depois que o caso de Maria da Penha repercutiu internacionalmente.

Em 10 anos de lei Maria da Penha foram mais de 5 milhões de denúncias de violência. Dos 4.762 assassinatos de mulheres registrados em 2013 no Brasil, 50,3% foram cometidos por familiares, sendo que em 33,2% destes casos, o crime foi praticado pelo parceiro ou ex.

Segundo ranking divulgado pela organização não governamental internacional Save The Children com mais de 144 países, o Brasil está entre os 50 piores países para se nascer mulher.

Regina Célia resgatou que o país ainda preserva fortes relações com período colonial, onde éramos regidos pelas Ordenações Filipinas, um código legal que se aplicava a Portugal e seus territórios ultramarinos. Com todas as letras, as Ordenações Filipinas asseguravam ao marido o direito de matar a mulher caso a apanhasse em adultério e também por suspeitar de traição, ou seja, bastava um boato.

No Brasil República, as leis continuaram reproduzindo a ideia de que o homem era superior à mulher. O Código Civil de 1916 dava às mulheres casadas o status de “incapazes”. Elas só podiam assinar contratos ou trabalhar fora de casa se tivessem a autorização expressa do marido.

JUNTOS - “O resultado disso é que hoje 70% das agressões contra a mulher ocorrem dentro de casa. Mas se engana que acha que a luta das mulheres é uma luta contra os homens. A luta das mulheres e homens e contra a sombra do patriarcado que ambos somos expostos desde que nascemos. O patriarcado nos ‘ensina’ desde pequenos que os homens não podem chorar, não podem fraquejar, não podem falhar, tem que dominar, enquanto as mulheres são criadas para serem frágeis e submissas. A luta pelo direito das mulheres é um compromisso com as futuras gerações de homens e mulheres”, destacou Célia.

Dulcilene Moraes lembrou também a dificuldade de se realizar o Encontro de Mulheres, “as dificuldades são muitas, e vão dificuldades familiares, como a opressão dos maridos ou a de não ter com quem deixar os filhos, a pressão na empresa, e a realidade é que muitas dirigentes no país deixaram de vir porque, além desses problemas, seus próprios sindicatos não se dispuseram a essa construção. Porque em momento de crise, dinheiro para dirigentes homens viajarem e participarem de atividades fora de seus estados e às vezes fora do país têm, mas para as mulheres não, precisamos mudar essa realidade”.

Aberto o debate os principais destaques e relatos foram a luta contra a opressão no ambiente de trabalho e em casa. A PEC 55 foi um tema bastante debatido, pois atinge fortemente a saúde e educação, ou seja, atinge ainda mais em cheio as mulheres, pois além de serem grande parte do setor de atuação feminino, quando estes serviço públicos são precarizados sobra também para as mulheres fazê-lo em casa.

Na parte da tarde as mulheres realizaram um ato comemorativo do dia 25 de novembro que é o Dia Internacional de Não Violência Contra a Mulher, distribuindo mais de mil panfletos nos semáforos da cidade do Recife.

A atividade terminou com a aprovação da “Carta do Recife às Mulheres Trabalhadoras do Brasil”, que entre outras coisas afirma que “com o agravamento da crise e da recessão, a tendência é do aumento estratosférico da violência contra as mulheres e do feminicídio, como demonstra a OMS (Organização Mundial da Saúde), os dados são alarmantes: no Brasil a cada 7 minutos há uma denúncia de violência contra as mulheres, com 13 mulheres sendo assassinadas por dia, ficando visível que o problema é desenhado acintosamente”. O próximo encontro será realizado no ano que vem.