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Operários paralisam construção da maior fábrica de celulose do mundo no MS

Cerca de oito mil trabalhadores cruzaram os braços nesta segunda-feira em Três Lagoas contra arrocho e precarização

Publicado: 31 Dezembro, 1969 - 00h00

Escrito por: Leonardo Severo, de Três Lagoas-MS

 

A construção da Eldorado, maior fábrica de celulose do mundo, foi completamente parada na manhã desta segunda-feira em Três Lagoas, interior do Mato Grosso do Sul. Cerca de oito mil operários decidiram em assembleia cruzar os braços devido à política de arrocho e precarização, que permanece sendo praticada pela empresa e suas subcontratadas, passado pouco mais de um mês do fechamento do último acordo.

A equiparação salarial entre as várias terceirizadas e quarteirizadas é a principal bandeira, já que existe muita desigualdade em termos salariais, de tratamento e de direitos.

"Havíamos convocado uma assembleia para tirar um indicativo de greve, antes de uma nova rodada de negociação com a empresa. Mas a categoria decidiu paralisar as atividades desde já, pois o acordo assinado está sendo descumprido", declarou Antonio Luiz, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção de Cacilândia e Três Lagoas (Sintiespav). A assembleia também foi dirigida por Agmar Luiz de Sousa, presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Construção Civil e Mobiliário de Três Lagoas (Sintricom).

O Sindicato havia proposto reajuste salarial de 20%; horas extras de segunda a sexta-feira de 100%; horas extras aos sábados, domingos e feriados de 175%; pagamento de horas in itinere (período de deslocamento até o trabalho); vale alimentação de R$ 500,00; folga de campo a cada 60 dias, com cinco dias de permanência no domicílio sem contar o tempo de viagem e Plano Médico Nacional de saúde extensivo aos dependentes.

 

Gilson Brito Frasão, Paulo Roberto de Paula (Sindmontagem), Corumbá (Conticom/CUT) e Nilson Cavalcante (Alimentação)Gilson Brito Frasão, Paulo Roberto de Paula (Sindmontagem), Corumbá (Conticom/CUT) e Nilson Cavalcante (Alimentação)CONTRAPROPOSTA MAGRA

Os empresários ofereceram 7,5% para todos os trabalhadores; piso para ajudante de R$ 860,00; piso para oficial de R$ 1.161,00; folga de campo a cada 75 dias. Além de prometerem de pés juntos cumprir com o já acordado mas constantemente descumprido.

Conforme adverte Webergton Sudário (Corumbá), presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário do MS (Fetricom) e da executiva da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e da Madeira (Conticom), são quase 200 CNPJs dentro de uma mesma obra, com as empresas se aproveitando disso para precarizar as relações de trabalho. "São salários diferentes para uma mesma função. São direitos, alojamentos, comida e até o tempo para passar com a família diferenciados. Temos empresas que pagam avião para o deslocamento e outras que sequer dão água aos trabalhadores, numa completa e inadmissível desumanidade. A Fetricom está ao lado dos operários em defesa de justiça e dignidade", ressaltou.

DA BOCA PRA FORA

O descumprimento do que foi negociado, alertou Corumbá, foi o novo estopim da revolta, a quarta paralisação desde que a obra iniciou há pouco mais de um ano. "Queremos que o governo federal atue, fiscalize e autue, pois o BNDES aprovou R$ 2,7 bilhões para a Eldorado, 53% do investimento total da obra. São recursos públicos, do trabalhador, da sociedade brasileira, que precisam de contrapartidas sociais. Infelizmente, mesmo o Compromisso Nacional da Construção, acordado recentemente entre governo, empresas e trabalhadores, está sendo desrespeitado. Para nós, basta!", frisou.

 

De acordo com Paulo Roberto de Paula, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Montagem Industrial (Sindmontagem), em vagaroso processo de legalização no Ministério do Trabalho, um dos expedientes mais repugnantes utilizados pela Eldorado é a repressão, que vai desde a demissão sumária de dirigentes sindicais até a contratação de policiais militares para fazer a "segurança privada" das empresas.

 

DEMISSÃO E REPRESSÃO POLICIALESCA

"Eu mesmo fui demitido assim que saiu o edital de fundação do Sindicato, no dia 15 de setembro de 2011. Um pouco menos de um mês depois, no dia 11 de outubro, quando fizemos uma assembleia de fundação com a presença de dois mil operários, todos os nossos dirigentes foram demitidos pelas empresas. A polícia militar também tentou impedir a realização da assembleia. É uma sequência de arbitrariedades", denunciou Paulo Roberto.

Mesmo cipeiros, que têm estabilidade garantida por lei, ressaltou o presidente do Sindmontagem, foram demitidos por convocarem a greve e, de forma absurda, abordados pela polícia em suas casas, revistados e ameaçados na frente da família. Documentos da própria Justiça, assinados pelo juiz titular Tomás Bawden de Castro Silva, intimavam as lideranças a pagarem dois mil reais por dia, num limite de "cem dias", caso se aproximassem dos canteiros de obra para mobilizar os trabalhadores.

Paulo Roberto denuncia que ele próprio chegou a ser ameaçado de morte na última greve, em novembro de 2011, por três homens que desceram de uma camioneta Hilux. Logo depois, o presidente do SIndmontagem foi agredido por policiais militares, na frente dos trabalhadores, e, novamente, convidado a deixar a cidade, "para o bem da sua família e de você mesmo". O presidente da Fetricom, Corumbá, presenciou a brutalidade dos policiais, que estavam com as armas engatilhadas, impedindo o socorro. "A polícia existe para proteger os cidadãos, não para resguardar os mesquinhos interesses de empresas que desrespeitam a lei", frisou o dirigente cutista. "Diante de tantas e tão flagrantes demonstrações de covardia e impunidade, estamos aqui para prestar solidariedade aos companheiros e fortalecer o seu movimento", acrescentou Corumbá.

Nesta terça-feira os trabalhadores permanecerão nos seus alojamentos aguardando a negociação das entidades sindicais com a Eldorado.

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