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Empresários da construção precisam de formação para lidar com novo perfil de operário, acredita secretário cutista

Para Manoel Messias, relações autoritárias das grandes obras do passado fogem à realidade atual

Publicado: 29 Março, 2012 - 15h18

Escrito por: Luiz Carvalho, de Rondônia

Entre os desafios que as empresas sempre citam há um ponto onipresente: a necessidade de melhorar a qualificação da mão-de-obra. Mas, será que as direções das empresas evoluíram e estão preparadas para lidar com um novo perfil de trabalhador?

As greves nas usinas de Jirau e Santo Antônio mostram que não. Ao menos no setor da construção, o empresariado e seus responsáveis nos canteiros ainda tem uma cultura oriunda das grandes obras do passado, em que predominava uma relação hierárquica, autoritária, de subordinação pelo medo e pela exploração.

É o que aponta o secretário de Relações do Trabalho da CUT, Manoel Messias, presente em Rondônia para intermediar a negociação entre operários em greve nas usinas de Jirau e Santo Antônio e as empresas.

“Por um lado há demanda, falta de mão-de-obra, e por outro há confinamento e renovação da força e trabalho, conjunto que impulsiona a mobilização”, afirma o dirigente.

Um novo perfil           
Além de o setor da construção estar aquecido graças a empreendimentos ligados ao Programa de Aceleração do Acrescimento (PAC), à Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas no Brasil, valorizando, portanto, quem está na área, há um novo perfil de funcionário, cada vez mais jovem e com acesso à comunicação por meio da tecnologia da informação. Soma-se a isso o fato de obras como Jirau contarem com velhos problemas das antigas grandes empreitadas e você tem nas mãos um enorme barril de pólvora.

“A construção das barragens comporta um ambiente de alta rotatividade, primeiro, porque as pessoas ficam pouco tempo na obra, já que não é fácil estar isolado, longe da família e dos amigos. Segundo, porque essa rotatividade aumenta o lucro das empresas, é uma forma objetiva de ter baixos salários. Por fim, quando surgem lideranças ou algum grau de solidariedade entre os trabalhadores, eles são demitidos”, explica Messias.

Em Jirau, a mobilização começou no dia 9, quando os 1.500 trabalhadores da terceirizada Enesa Engenharia cruzaram os braços para cobrar melhorias nos alojamentos. Três dias depois, o movimento se espalhou por toda a obra e atingiu os demais 14 mil operários. Já em Santo Antônio, a paralisação conta com os 15 mil funcionários desde o último dia 26.

Compromisso na pauta
Em março do ano passado, nas mesmas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio a revolta contra as precárias condições de trabalho deram origem a uma greve que durou 28 dias e abriu os olhos do movimento sindical, do governo brasileiro e do empresariado para a necessidade de criar um plano com regras mínimas para o setor. Surge, então, o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Construção Civil, assinado pelos três setores.

Segundo o dirigente da CUT, os empresários mantém o desejo de fazer com que o documento seja considerado, apesar de ainda não ter sido implementado, de fato, em nenhuma obra no Brasil. Porém, a dificuldade em dialogar com os trabalhadores mostra que um ponto essencial desse acordo, a criação da comissão sindical de base, com representantes diretos dos operários, não terá facilidades para ser colocado em prática. Novamente, por problemas com a qualificação da chefia. “O compromisso não será efetivado se as empresas não superarem seus métodos autoritários e não definirem responsáveis nos canteiros pelo diálogo permanente, pessoas que precisam de formação, capacitação e de autonomia para resolverem as pendências. E sem abrir esse canal de diálogo ficaremos sempre remediando as crises”, ressalta Messias.

Além disso, explica, é preciso incluir as terceirizadas na discussão. “Com os problemas na Enesa, que iniciaram a greve em Jirau, fica claro que o acordo não pode ser apenas das principais empresas, mas de todos envolvidos na obra e o responsável pelo empreendimento ser o fiel guardião do compromisso.”

Obstáculo sindical –Os desafios, porém, não são restritos à fatia patronal. Os sindicatos também precisam aprender a conviver com a comissão de base e promover a integração desses representantes com os dirigentes para lutarem juntos. “O grande desafio do nosso lado é formação dos sindicalistas e dos trabalhadores para que desenvolvam uma cultura de diálogo permanente que deverá ser legitimados pelos trabalhadores.” 

Criminalização dos movimentos sociais
Manoel Messias critica ainda o papel que a Justiça acaba exercendo em mobilizações como essas no estado de Rondônia. Ele lembra que a CUT defende o Judiciário como um importante de mediação dos conflitos, mas critica quando é utilizado para sufocar sem resolver o problema. “Quando nos posicionamos contra o dissídio coletivo, denunciamos que o problema é o empresariado continuar vendo a Justiça do Trabalho como uma forma de sufocar o conflito trabalhista sem solucionar as causas do problema. E, infelizmente, mais uma vez no caso de Santo Antônio e Jirau a Justiça se prestou a esse papel. Primeiro criminalizou trabalhadores e sindicato, declarou a greve ilegal, para depois se preocupar na busca de uma negociação. É o inverso da lógica, porque é a lei que responde às necessidades sociais e não o contrário. O poder Judiciário acaba por cumprir esse papel histórico e não funciona como instrumento de avanço e social.”

Em Santo Antônio, por exemplo, foi a empresa quem dispensou os operários após a explosão da mobilização em Jirau. E mesmo antes da greve ser declarada, já era considerada ilegal.  Justiça acaba por cumprir esse papel histórico e não funciona como instrumento de avanço e social.

Segundo o dirigente, é preciso fazer com que essa mobilização termine como um instrumento de ampliação e consolidação de direitos. “Queremos que não seja simplesmente um protesto para atender questões emergências e sim um marco para avançar na luta e servir de exemplo a outros canteiros. Acredito que evoluímos nesse aspecto.”